sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Pé-de-Passarim II

A videira virou pé-de-passarim...
Mas não é que deu uva também?
Que de verdes ficaram roxas
E de sua doçura testemunharam os passarim.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Contando Maços

Acordo e logo procuro por um cigarro. É o ultimo do maço. Pego-o. Atiro o maço vazio junto aos outros e eles já são uma pilha. Ainda esses dias joguei todos os maços vazios fora. Há quantos dias? Eu posso contar pelos maços. Quantos maços tem um dia? Pouco mais de um. Se são sete os maços na pilha, devem ser seis ou cinco dias. Será que deveria jogá-los fora? Melhor não. É minha certeza de que os dias continuam passando.

Das Terras-Sem-Sol

O jovem abre seus olhos: a sua volta, uma terra desolada onde caminham pessoas escoriadas, esquartejadas, evisceradas ou, até mesmo, decapitadas. Levanta-se, olha para o próprio peito e o encontra aberto, vazio. De longe, avista uma jovem mulher, muito bela, com um ferimento parecido com o seu.
_ Olá! - grita - Você pode me dizer onde estamos?
_ Nas Terras-Sem-Sol, o mundo dos mortos - ela grita de volta.
_ É... - pondera ele enquanto olha para a jovem e para os que passam segurando suas próprias chagas - Não parece tão diferente do mundo dos vivos.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Pé de Passarim

Um passarim fez ninho em minha videira,
Mas suas uvas nem fazem menção de maturar...

Ei, passarim! 'Ce vai bicar minhas uvas mesmo verdes?

O passarim botou um ovo no ninho da videira
E mesmo que as uvas não maturem, vai ter valido a pena
Ver minha videira virar pé de passarim.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

É muito fácil dizer “eu não tenho medo de demônios” enquanto ocupa-se em desviar os olhos de suas faces sulfurentas.

Mas eu quero ver você, olhando nos olhos do Capeta, sorrir com divertimento e dizer: “Você não me assusta.”

Mas é necessário fazê-lo. É necessário descer ao inferno, pois só assim se pode conquistar o poder do Diabo: o poder de abrir caminhos.

terça-feira, 1 de junho de 2010

A Derradeira Navalha

De que me vale navalha
que sangue não derrama?

De que me vale navalha
que sangue não reclama?

Ah, navalha fria!
Meu sangue não fazes correr!
... and the 20th Century Boy grew up to be a 21st Century Schizoid Man.

(I wanna be you [post-modern] toy!)

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Neu Goethe!

O poeta jaz moribundo em seu leito de morte e todos aguardam pelas lendárias ultimas palavras, o canto do cisne. Chega o momento derradeiro:

_ Pop! - pediu o poeta - Mais pop!

Depois: silêncio.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Igreja Renovada de São Simão Freud

Há tempos que brinco, um tanto escondido, com os meus, que minha religião é a psicanálise. Afinal, como se dedica uma hora por semana, religiosamente, ao culto/missa, dedico às sessões de análise.
Mas entra em cena algo que minhas companhias dolorosamente me rememoram: a interpretação.

Recordo-me do tempo em que li Freud pela primeira vez, coisa de cinco anos atrás. A poderosa ferramenta interpretativa criada por ele é mesmo com um Buddha de olhos cintilantes. E sim, ela me cativou: parecia dar conta de tudo, explicar tudo.

Naquele tempo eu me descobri sedento por acreditar. Naquele tempo, tão bom, podíamos simplesmente acreditar.

Contemporaneamente, travava contato pela primeira vez com os textos nietzscheanos (dos quais guardo uma distância segura até hoje, numa relação confusa, apaixonada), mas a sua evidência já era grande pra mim: ao menos meu Deus já estava morto.

Este vazio, antes preenchido pelo Divino Superpai, demiúrgico, é sentido com urgência. A isso expressa muito bem o poeta, ao desejar poder crer num manipanso qualquer.

É inegável que entrei nessa viagem pelo convite freudiano e em pouco depois aderi ao corpus jungiano, talvez pelo caráter mais otimista, talvez pela estranheza causada pela idéia do drama/romance familiar edipiano como complexo nuclear. Levou um bom tempo até que uma proposta nova chamasse a minha atenção para Lacan: a provocação, a ironia.

Alguém poderia sentir-se tentado a culpar a graduação em filosofia pela chegada da peste, mas antes é terreno fértil para que esta planta demoníaca continue a crescer, partindo o concreto desta pavimentação, regada por estas já mencionadas companhias tão marcadas pelas virtudes, também, do inferno.

A peste é este desassossego de saber-se sem jamais poder crer... ou mesmo, saber.

Biel e eu conversamos longamente. É sempre assim, eu ansioso por dormir (ou, antes, ansioso por não ser questionado por meu atraso e não passar o dia sonolento), mas igualmente interessado pela conversa. Ele me fala sobre ansiedade e sobre organizar o tempo. Eu brinco de "amigo lacaniano", devolvo a responsabilidade, ofendo, provoco, ironizo com fatos. Falo tanto pra ele quanto pra mim, mas me encolho esperando a resposta que não vem. Ela não se enuncia, mas a peste já está em mim.

"Você não acredita em nada", diz Sinop, nunca em tom lisonjeiro, com certa freqüência. Rio-me e penso , ou digo, que errado é quem acredita, mas lembro angustiado deste drama de crer sabendo que não posso fazê-lo e agir sempre fendido pela contradição.

Mas um amigo surge e me lisonjeia ao chamar esse "pessimismo clubedalutiano", que oscila entre o poético e o concréto, de raro.

Talvez a peste não seja.

Talvez eu só esteja confuso pelo desejo de crer, o dever de questionar e a necessidade de jamais me deixar domar.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Afronte Feito

Bem, é isso, Ato I feito.

Tudo correu razoavelmente dentro do script. Um pouco melhor, até.
Da próxima vez, deveríamos distribuir folhetos com a programação.

Resta-nos perguntarmos pelo que realmente foi afrontado, o efeito do ato nos transgredidos e transgressores, as dimensões todas de significação... E algumas das discussões que poderiam ter sido realizadas antes do ato. Ou não. Temos também uma vasta experiência por gerar saberes para nosso preparo e proteção. Entre estas, as observações de como as pessoas (e, entre elas, nós mesmos e os nossos) reagem frente ao exercício de poder repressivo, da coação ou, se preferirem, da resistência.

Dentre as reflexões que se impõem, temos a pergunta inicial: "Por que afrontar?". Eu concordo, a resposta é, sempre: "Por que não?". Mas a gente se vê as voltas com um discurso muito mais segregador que o discurso do mainstream, dito normativo: o discurso político-ideológico.
Não o discurso ideológico burguês e essa merda toda, mas o discurso ideológico das confrarias dos coletivos politicamente orientados, revolucionários ou não, de ativistas políticos e culturais. O que se cobra é que tenhamos uma finalidade, que esta seja instigar o pensamento crítico e que este pensamento gere, por fim e por certo, uma conscientização: a conscientização de que eles estão certos. Não só o debate permanece fechado, como se perde completamente de vista que todos estamos no front, com o rabo na reta e, sobretudo, do mesmo lado: temos interesses em comum.

Eu falaria do ato pelo ato, de valores intrínsecos, da primazia do significante sobre o significado, da dúvida razoável. Mas foda-se. A experiência foi rica e plenamente positiva, cabendo-nos apenas significá-la de maneira apropriada.

Quem não foi, perdeu. Perdeu os espetáculos, incluindo o dado pelos vizinhos vigilantes e nossa sempre pronta e carismática força policial.
Mas é apenas o começo.
Afrontemos!

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Do outro lado, temos a oportunidade de prestigiar o grande esforço realizado por certas pessoas para desabonar a dita categoria estudantil. Não que, de fato, o comportamento da maior parte da categoria não comprometa fortemente nossa imagem. Mas, muito bem diz a Revelação de Sturgeon: "noventa por cento de tudo é tosco."

"Agora quem tem que pagar o que apronta..."

Confiram a noticia na mídia local:

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Sobre o Belo

Eis o que há de mais belo:
O musgo crescido nas rachaduras,
A sujeira acumulada sob as unhas.

A flor que cresce no asfalto é ainda flor,
pálida reminiscência de uma poesia doente.

Poético é o conflito, concreto partido.
Belo é o arbitrário deteriorado:
A vingança.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Afronte - Ato I : Cuidado com a sarjeta.

Bem, por maior que seja a viagem, ela começa com um simples passo... Ao menos é o que dizem.



Então, fica o convite para o Ato I.

Afronte.

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Vale lembrar que eu atuo junto ao tal katet de ensaios sonoros.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Monólito

O vento sopra, a água corre
passando pelo monólito

Imobilidade. Será?

O mundo gira, o monólito erode
Em formas que só o tempo pode dar.

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(O que me lembra, meio às avessas:
"O pensamento é escravo da vida e a vida é joguete do tempo. E o tempo, testemunha do universo inteiro, deve parar".)

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Poema fresquinho. Resultado do diálogo de um capricorniano com uma geminiana.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Ontologia Poética: Benj'a-mim I e II

Benj'a-mim I

Cacoetes...

Deusa, quase me esqueço!...
O estilhaço colorido do vitreau!

Coisas guardadas em caixas...

Gênese?

Críptico, meu ser repousava na estrutura
quando a pedra apresentou objeção...

Resignificonfiguração.

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Benj'a-mim II

Forjafalar, transgredindo-se sempre!
Sem jamais sanguerramar ao ser insubinsistente.

Forjafalar sempre uma entidarte, qual dEUs ou ser-eia!

N'uma apresentificação do solidesintegrado,
forjafalo nuclesquizintomático desta farceria.

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Nada como uma aula sobre os ensaios críticos de Baudelaire para inspirar a poesia em nossos corações. Ou o deficit de atenção.
De todo modo, são dois poemas de psicografia peripatética, do jeito que Éris manda.
São os primeiros a apresentar o estilo adequado (neológico) do blog d'O Núcleo e por isso aparecem postados lá. Na verdade, o segundo é uma espécie de manifesto auto-crítico/auto-irônico para aquele blog e pra mim.
Por fim, 'forjafalar' e 'entidarte' são, daqui em diante, termos técnicos no meu cânone.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Ecce Bloggus!

Hummm... Adiando por muito tempo, vamos logo compor um texto inaugural pra esse blog.

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Andava com saudades de ter um blog. É algo meio retrô, nesses tempos de twitter e blá, mas é um formato em que cabe bem minha verborragia.

Acho que meus últimos textos postados datam de dezembro de 2007, no ainda online On Being Sane In Insane Places. Parece que parei por acreditar que não tinha nada interessante pra escrever. Sim, a fuga, transtornos neuróticos.

Na verdade, era como se aquele ultimo texto, “A Minha Vida na Avenida Governador Mário Covas”, não pudesse ser superado. Eu gostava muito dele à época. Acho meio bobo, hoje. Era um texto em “fluxo de pensamento”, que foi uma forma com a qual eu realmente me identifiquei, principalmente na época do Defenestrando Conjecturas, outro blog extinto.

Desde o começo da Era Blog, nos remotos tempos de blogger.com.br, tive muitos. Primeiro o "Policromia Mórfica (ou Polimorfia Crômica?)". Depois o "Repudiável Mundo Novo", um blog coletivo. Teve até um que eu escrevia junto com uma garota do... Espírito Santo? (como era mesmo o nome dela?). Tempos de ICQ. Se me lembro, o blog se chamava "Martelo & Bigorna". Também existiu o "Fantástico Mundo de Jack" (onde a parceria com o Isaac, dos tempos de Repudiável se repetiu) e do qual eu e o Hugo finalmente migramos pro On Being Sane...

Quase todos os textos se perderam. Lamentável.

Nesse hiato que existiu, muitos textos me passaram pela cabeça. Nunca param, alias. E quase fundei uma porção de blogs. Até escrevi o texto inaugural de um deles, onde eu gastava um tempo falando sobre Scott Pilgrim e 20th Century Boy, a forte presença do tropeascended fanboy’ neles e sobre como isso tudo me comove e por que raios eu me recuso a ler mangá hoje em dia. Mudei o nome do blog e a introdução perdeu o sentido. Tantos textos se perderam por não terem um depositório... É hora de começar.

No fim, o blog é pra isso: pra escrever por escrever, escrever porque os textos ocorrem sem serem convidados, escrever pra manifestar, refletir, sintomatizar, relatar, especular... Sobre esquisitices, cotidianidades, angústias, anseios, teoria, prática... sobre nada e sobre tudo. Como num diário, introvertido: não pra contar o que acontece, mas o que penso sobre o que acontece. Afinal, como diz o [heterônimo do] poeta: “Pois o que é tudo senão o que pensamos de tudo”. É uma espécie de auto-exorcismo, acho. Oportunidade para uma ontogenética, uma exegese de si mesmo pelo discurso.

A palavra é farmacon. A palavra é morte da coisa. Sepultemos, pois, a entidarte enxertada no discurso pra suprir a omissão do sujeito do mesmo...

Por fim, pensei que talvez devesse dizer quem sou. Mas, conforme já dito, acho que isso há de se manifestar no texto. Mais do que eu gostaria, até.